terça-feira, 1 de março de 2011
Era a Maria
Ela apareceu conforme planeado.Tinham combinado que ela passaria por casa dele, ao fim do dia, para acabarem o trabalho que tinham em mãos e cujo prazo estava prestes a terminar. Chegou à hora prevista. O velho casarão, para onde ele se tinha mudado, há pouco tempo, parecia sinistro. Rodeado pelos altos abetos e com a ténue luz que os candeeiros do passeio emitiam, o casarão causava-lhe arrepios.
–“ Se eu não estiver a Maria abre-te a porta.” Tinha-lhe dito o João.
De facto, o carro dele não estava por perto.
-“Ainda não chegou.” Pensou ela. Subiu as escadas, da frente, e parou à porta. Estava entreaberta. Entrou, e avançou com medo. Um estranho barulho fez desviar a sua atenção para o piso superior. Parou ao fundo das escadas e o barulho de alguém a bater à porta parecia-lhe, agora, cada vez mais próximo. Subiu os primeiros degraus. O barulho teimava em continuar. Subiu um e mais um degrau. Contorcia-se de medo. Um misto de coragem corria-lhe nas veias, misturada com laivos de medo e suspense. O bater da porta pareceu-lhe muito mais intenso e o seu corpo estremeceu por completo. Ao cimo das escadas viu um ramo de uma árvore bater na janela. Sim, era esse o barulho que tinha ouvido. Não era ninguém, era sómente o barulho de um ramo a bater no vidro da janela. Entretanto, a noite caía e o casarão escurecia. Tentou procurar um interruptor. Viu um ao cimo das escadas, no piso superior. Tinha que subir, atravessar todos aqueles quadros antigos, relíquias de família, onde os antepassados do João figuravam e tomavam conta dos degraus e controlavam quem os subia e quem os descia.
-“Com tantas casas, porque teria o João escolhido aquele casarão?!” Não sabia. Ainda não tinham tido tempo para falarem sobre isso. O projecto em que estavam enfiados absorvia-lhes as horas, os minutos e os segundos. Não tinham tempo sequer para respirar.
Tentou o interruptor e nada. Viu outro ao fundo do corredor. Ao fundo do longo corredor que embelezava o primeiro piso. Na sua mente milhares de sombras pareciam-lhe enganar os seus olhos. Viu coisas que nunca pensaria ver, sentiu um sopro por entre os seus cabelos e olhou para trás. Não estava ninguém. Pelo menos é o que parecia.
-“Pára, tu estás sózinha, é a tua mente que brinca contigo.” Tentou acalmar-se e ganhar postura. Percorreu o corredor de cabeça erguida e ligou o interruptor. Mal o fez, desatou a correr pelo corredor fora e desceu as escadas duas a duas. Num ápice colocou-se no átrio. No ponto de partida. Mas agora não temia nada. As luzes estavam acesas e o casarão iluminado. De novo, sentiu aquele sopro passar-lhe pelo rosto, virou-se para trás e depois para a frente. Nada. E o sopro novamente. Viu uma porta entreaberta. Pensou para onde íria dar. E o João que não aparecia. Sempre o mesmo. Era sempre o mesmo atrasado. Nunca cumpria os horários e ela que era tão pontualmente britânica.
-“Ai João! Quando chegares vais ouvir das boas!”-pensou ela.
E avançou em direcção à porta. Parou. Escutou. Sentiu passos. Ouviu algo. Tentou não respirar. Tentou não se mexer. Qualquer movimento poder-lhe-ia ser fatal.
Tinha a mão colada ao puxador da porta. Tremia de medo. Do outro lado, os passos pararam, os ruídos terminaram. Sentiu o manípulo da porta rodar e viu a sua mão rodar com ele. A porta abriu-se e ela gritou com toda a força que tinha, do outro lado também se ouviu um grito imenso. Todo o casarão acordou naquele grito uníssono. Era a Maria.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário